SINTONIA . CONHECIMENTO DIRETO . CELEBRAÇÃO fortalecimento interno . consciência . integração . agniescola@gmail.com


sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

PARA UMA RAZÃO ABERTA

"Hoje, parece-nos racionalmente necessário repudiar toda a “deusa” razão, isto é, toda a razão absoluta, fechada, auto-suficiente. Temos que considerar a possibilidade de evolução da razão.

A razão é evolutiva A razão é o fenômeno evolutivo que não progride de forma evolutiva e linear, como julgava o antigo racionalismo, mas por mutações e reorganizações profundas....A razão deve deixar de ser mecanicista para tornar-se viva.

Crítica e superação da razão fechada A razão fechada rejeita como inassimiláveis fragmentos enormes de realidade:....a questão da relação sujeito-objeto no conhecimento; a desordem, o acaso; o singular, o individual (que a generalidade abstrata esmaga); a existência e o ser, resíduos irracionalizáveis....A poesia , a arte, que podem ser tolerados ou mantidos como divertimento, não podem ter valor de conhecimento e de verdade, e encontra-se rejeitado, bem entendido, tudo aquilo que denominamos trágico, sublime, irrisório, tudo o que é amor, dor, humor...

Só uma razão aberta pode e deve reconhecer o a-racional. Pierre Auger observou que não nos podíamos limitar ao dítico racional-irracional. Há que acrescentar o a-racional: o ser e a existência não são nem absurdos, nem racionais, eles são. Ela pode e deve reconhecer igualmente o sobrerracional (Bachelard). Sem dúvida toda criação e toda invenção comportam alguma coisa desse sobrerracional, que a racionalidade pode eventualmente compreender depois da criação, mas nunca antes. Pode e deve reconhecer que há fenômenos simultaneamente racionais, irracionais, a-racionais, sobrerracionais, como talvez, o amor...

Por aí, uma razão aberta torna-se o único modo de comunicação entre o racional, o a-racional, o irracional.

A razão complexa A razão fechada era simplificadora. Não podia enfrentar a complexidade da relação sujeito-objeto, ordem-desordem. A razão complexa pode reconhecer estas relações fundamentais. Pode reconhecer em si mesma uma zona obscura, irracionalizável e incerta. A razão não é totalmente racionalizável...

A razão complexa já não concebe em oposição absoluta mas em oposição relativa, isto é, também em complementariedade, em comunicação, em trocas, os termos até ali antinômicos: inteligência e afetividade, razão e desrazão. Homo já não é apenas sapiens,  mas sapiens/demens.

...O real sempre excede o racional. Mas a razão pode desenvolver-se e tornar-se complexa. “A transformação da sociedade que o nosso tempo exige revela-se inseparável da auto-superação da razão (Castoriadis)."
(Edgar Morin. Ciência com Consciência)

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

PERFORMANCE, ESTÉTICA E ANÁLISE CRÍTICA Hanna Pires . 2016
                                                     antropologia inversa
                                                        culturas hibridas
                           criação de um tempo espaço de experimentação

bernar venet
                                               Considerada uma arte híbrida por ter uma natureza multidisciplinar, a performance utiliza diversas linguagens artísticas, como as artes visuais, o teatro, a música, a dança, o cinema, o vídeo, a cyber-art, para a produção de um experimento. Porém, mais do que isto, mais do que uma visão estética, a performance traz em si a condição da análise crítica, pois o performer é um cronista do seu tempo/espaço, que reflete e problematiza os fluxos, formações e composições contemporâneas. Richard Schechner, professor de Estudos da Performance na Tisch School of the Arts da New York University, afirma que qualquer coisa pode ser estudada como se fosse performance: uma ação, um comportamento, uma evento, uma coisa. Os estudos performáticos explicam algo, mostram fazendo. A performance é dinâmica. ‘Fazendo’, ‘mostrar fazendo’, são ações que estão em fluxo e sempre mudando. As performances _ de arte, rituais, ou da vida cotidiana_ são comportamentos restaurados, comportamentos duas vezes experienciados. Que ajudam a compreender os hibridismos da cultura, os encontros trans-fronteiriços, os sincretismos, encontrados hoje principalmente nas grandes metrópoles e nas cidades de uma forma geral, que comprometem a noção de comunidade unificada e favorecem a fragmentação.
                                               Segundo J.J.Lotufo, em A Arte da Performance entre Fronteiras, o ‘desmanchamento de certos mundos’ e o surgimento de outros, a presença de novos sentidos culturais, se faz em meio ao conflito incessante de regulação e de liberação existente na sociedade atual. O fluxo intenso de informações e impactos de toda ordem, o convívio na era digital pulveriza os locais de fala e escuta e torna complexas as formas de comunicação. O nomadismo característico do nosso tempo, a desterritorialização, o efêmero e o disperso como condição da subjetividade atual, demonstram quão impraticável é a esperança de manutenção de uma identidade cultural pura, estável e contínua. Noções de identidade, cultura, pertencimento, tornam-se bem mais complexas, demandando um processo de reinvenção contínua de sentido e valor. Na arte da performance estas contradições, ambiguidades e paradoxos podem ser e usualmente são utilizadas como rico material de trabalho, favorecendo as experimentações em torno das complexidades próprias do nosso tempo. Novos esboços, questionando as representações e os papéis sociais vigentes, são traçados na tentativa, sempre provisória, de abarcar esta complexidade do/no tempo. 
                                               Neste tempo onde não há delimitações estanques, pois em algum grau tudo se interconecta, a arte da performance favorece a alteridade e se mostra pertinente para problematizar representações culturais do ‘outro’. Quem representa quem? Quem é representado? Como e o que é representado?
                                               
ANTROPOLOGIA INVERSA
                                               Através da performance é possível se estabelecer uma espécie de ‘antropologia inversa’, invertendo-se papéis sociais, hierarquias. Grupos minoritários tornam-se protagonistas; novas formas de colaboração são apresentadas como uma opção politica. Trabalhos de desconfiguração da ordem dominante, inversões étnicas e de gênero, travestimento cultural, subversão de poderes são meios de levar ao centro as culturas híbridas e às margens, o exótico e estranho. Todo este jogo de inversão das estruturas sociais, se dá como parte importante do processo de descolonização. Ao descolonizar o próprio corpo _ entendido também como “território ocupado”_ em frente ao público, acredita-se poder despertar questionamentos que por vezes podem extrapolar o momento da performance, trazendo inspiração ao publico participante para agir no seu cotidiano.

HIBRIDISMO CULTURAL
                                               Presente fortemente na performance, o hibridismo cultural é o processo de mistura, de junção de diferentes matrizes culturais. A vertiginosa expansão urbana verificada nos nossos tempos, acaba por fazer com que as cidades concentrem praticamente 70% da população. De sociedades dispersas em milhares de comunidades rurais, tradicionais, locais e homogêneas, passamos a esta trama urbana onde se verifica uma interação do local com redes nacionais e transnacionais de comunicação.
                                               Canclini (2011) salienta que as culturas pós-modernas podem ser ditas de fronteiras. São resultantes do contato com o “outro” e decorrentes dos deslocamentos de bens simbólicos. O autor vê o hibridismo como um processo multicultural, de diálogo entre diversas culturas. A cultura é vista como algo não mais genuíno, mas sim, e muitas vezes, como algo representado. O que existe hoje, para o autor, é o simulacro como marca cultura.
                                               Hutcheon (1991, p. 30) chama atenção para o fato de que as culturas pós-modernas, essencialmente híbridas, possibilitariam a contestação do discurso dominante na construção de novos discursos, descentralizados, fundamentados no contexto multicultural. 
“A Cultura (com C maiúsculo, e no singular) se transformou em culturas (com c minúsculo, e no plural), como foi documentado com detalhe por nossos cientistas sociais. E isso parece estar ocorrendo apesar – e, eu afirmaria, talvez até por causa – do impulso homogeneizante da sociedade de consumo do capitalismo recentemais uma contradição pós-moderna.” (HUTCHEON, 1991, p. 30)   

HISTORIANDO...
                                                               Em 1960 é lançado em Paris, o Manifesto da Internacional Situacionista, organizado por um grupo de jovens franceses dotados de uma autodenominada "ideologia marginal", onde se incluíam poetas, escritores, arquitetos, e artistas "marginalizados". Buscavam uma alternativa para teorizar as "práticas espontâneas" desenvolvidas no seio da subcultura boêmia da Rive Gauche parisiense. Guy Debord, autor do livro A Sociedade do Espetáculo, foi o fundador e líder ideológico do Movimento Internacional Situacionista, e assumia nitidamente uma postura "contra-cultural" numa época por ele denominada de "sociedade do espetáculo". 
“O espetáculo não é uma coleção de imagens, mas uma relação social entre pessoas, intermediada por imagens… O espetáculo em geral, como uma concreta inversão da vida, é um movimento autônomo do não vivente… O mentiroso mentiu pra si mesmo” – Guy Debord
"Nós vivemos em uma sociedade do espetáculo, isto é, toda a nossa vida é envolta por uma imensa acumulação de espetáculos. As coisas que eram vivenciadas diretamente agora são vivenciadas através de um intermediário. A partir do momento que uma experiência é tirada do mundo real ela se torna um produto comercial. Como um produto comercial o "espetacular" é desenvolvido em detrimento do real. Ele se torna um substituto da experiência." -  Spectacular Times de Larry Law.
                                               Raul Vaneigem, escritor e filósofo belga, autor do livro A Arte de Viver para as Novas Gerações, foi também um dos principais articuladores do movimento, propondo questionamentos sobre o papel da produção cultural na sociedade consumista do pós-guerra e destinando fortes críticas para a "pasteurização da vida cotidiana", em meio a qual os usuários encontravam-se "embutidos nas fórmulas de uso".
                                               Os situacionistas tinham como tese central a construção de situações (performances) para se chegar à transformação revolucionária da vida cotidiana. Propunham uma revolução cultural contra a banalidade do cotidiano, contra a alienação e a passividade da sociedade. De 61 em diante passaram a se dedicar a questões exclusivamente políticas, ideológicas revolucionárias, anti-capitalistas, anti-alienantes e anti-espetaculares. 
                                               Opunham-se ao chamado ‘funcionalismo’ do modernismo, excesso de racionalismo e utilitarismo nos projetos das edificações e no planejamento urbano e estavam convictos de que a própria sociedade poderia e deveria mudar a arquitetura e o urbanismo. Seria a forma situacionista de viver e experimentar a cidade. Quando os habitantes passassem de simples espectadores a construtores, transformadores e ‘vivenciadores’ de seus próprios espaços, isto impedira qualquer tipo de espetacularização urbana. Esta visão inspirou o surgimento do Urbanismo Unitário (UU) que propunha a arte e a técnica como meio para a construção de um ambiente integral, em ligação dinâmica com as experiências de comportamento. Para este ideal urbano-experimental, uma construção estática do espaço seria incompatível com as contínuas mudanças de comportamento de uma sociedade.
                                               Para se viver esta forma de urbanismo são criadas algumas ‘ferramentas’: a Psicogeografia, como um método e a Deriva, como uma prática. A Psicogeografia consiste no estudo dos efeitos do meio sobre o comportamento afetivo dos indivíduos. A Teoria da Deriva é uma performance comportamental experimental, significa flanar, do verbo francês flanêr, vagar por aí, passar por ambiências variadas, interferindo concreta ou abstratamente (através da observação e da emoção) sobre elas. Esta prática da Deriva propunha uma experiência artística-sensorial com bases conceituais muito particulares, com caráter lúdico e experimental. As atividades lúdicas conduziriam, consequentemente, a uma inevitável dinamização do espaço. O principal habitante do espaço dinâmico seria o homo ludens, definição situacionista para o homem que "atua sobre o seu entorno, interrompe, muda, intensifica seu micro contexto imediato". Mais do que um espaço de trabalho, o espaço dinâmico era considerado objeto de jogo, e isso impulsionava a demanda pela mobilidade e variabilidade de suas ambiências e estruturas. Contrários aos rápidos deslocamentos, tornava-se imperativo intensificar o uso do espaço, potencializando o jogo, a aventura e a exploração.

                                               A primeira Internacional Situacionista foi desfeita no inicio dos anos 70, mas suas idéias situacionistas continuam ecoando ainda hoje, principalmente pelos amantes da liberdade.

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'LA POCHA NOSTRA' CONHECENDO UMA EXPERIENCIA DE CRIAÇÃO NA PERFORMANCE
referências


ARTESUNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR LITORAL . HISTÓRIA E APRECIAÇÃO DO TEATRO 
LA POCHA NOSTRA
CONHECENDO UMA EXPERIÊNCIA DE CRIAÇÃO NA PERFORMANCE


‘La Pocha Nostra’ é uma organização de arte multidisciplinar sediada em São Francisco, com facções em outras cidades e países, cuja mais significante contribuição talvez tenha sido no reino hibrido da cyber-art performance/instalação. Garante um centro e um fórum em rede para artistas rebeldes, de várias vertentes, gerações e backgrounds étnicos. Seu denominador comum é o desejo de desafiar, atravessar e apagar perigosas fronteiras entre arte e política, prática e teoria, artista e espectador, mestre e aprendiz, pesadelos corporais e culturais. Luta por erradicar mitos de pureza e dissolver fronteiras que cercam cultura, etnicidade, gênero, linguagem, poder, metier, infelizmente ainda considerados como atos radicais.
                                               Criam museus vivos interativos que parodiam várias práticas culturais de representação. Em contexto de ficção, exibem-se a si próprios como artefatos humanos, com corpos altamente decorados, algumas vezes como especimens de perigosas tribos, outras como santos fronteiriços de religiões perseguidas; outras vezes entregam-se à audiência e assumem a composição de identidades ditadas pelos medos e desejos dos visitantes de museus e/ou de usuários da internet. Durante suas performances, ambos, os membros da audiência e os performers estão constantemente tomando decisões estéticas, políticas e éticas, in loco, sem nem se perceberem disto. Para a audiência, escolhendo ou não participar nesta ou naquela performance, o jogo significa que se torna necessário para eles, exercitarem seus músculos cívicos e sua inteligência política. Ai é precisamente onde eles sentem que reside o verdadeiro poder político do trabalho.
                                               No final da performance, costumam criar quadros vivos com os membros da plateia mais responsivos e audaciosos, manipulando simbolicamente a posição de seus corpos e tirando ou acrescentando peças de roupa e adereços para suas ‘personas improvisadas’. A distância entre o performer e a audiência é completamente apagada. O que a platéia ao vivo acaba experimentando é uma antropomorfização estilizada de seus próprios (ou dos próprios performers) demônios pós-coloniais e alucinações _ uma espécie de poltergeist cross cultural onde o espaço entre si e o outro, performers e o outro, medo e desejo, tornam-se turvos e inespecíficos. Isto se torna o marco zero nas relações interculturais.
                                               Neste sentido a performance /instalação funciona ao mesmo tempo como um set bizarro de design para  uma afirmação contemporânea das ‘patologias culturais’, e como um espaço cerimonial para as pessoas refletirem sobre suas atitudes através de outras culturas. As imagens brincalhonas e sedutoras destes perigosos jogos de fronteira, border games, criam uma atmosfera onde os membros da audiência não estão imediatamente conscientes da implicação de suas ações _ até a próxima manhã quando eles acordam com uma ressaca cultural e uma “filosófica dor de cabeça.”
                                               O objetivo do coletivo segundo os próprios é de soltar os demônios milenares e como artistas performáticos entender seu novo papel e lugar nessa cultura do extremo espetáculo. Os subtextos destes jogos performáticos parecem ler: “todos somos racistas e sexistas, todos temos tesão, somos ternos, brincalhões e violentos, é da natureza humana; todos estamos implicados nesta loucura; vamos entender isto juntos; vamos atravessar os limites de cada um e compreender”.
                                               É precisamente nestes crus interstícios de tolerância/intolerância onde se pode promover um diálogo das relações interculturais, ao invés de pretender que gestos ocos de simpatia e empatia possam transformar a condição humana da noite para o dia.
                                               POCHA NOSTRA acredita fortemente que a performance promove o diálogo criando várias vias, trajetórias e intersecções insuspeitas que são na maioria das vezes descobertas/aprendidas através do corpo e posteriormente circulam através da linguagem e da ação. Para o momento consideram que seu trabalho é o de abrir a ‘caixa de pandora’ do nosso tempo e deixar os demônios perdidos; abrir por assim dizer, a ferida infectada da ‘fronteira’; segundo eles, outros _ os  acadêmicos, os ativistas_ terão que ajudá-los a entender, domesticar e lutar contra tais demônios....




ARTESUNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR LITORAL . HISTÓRIA E APRECIAÇÃO DO TEATRO 

referências 
PERFORMANCE ESTÉTICA E ANÁLISE CRITICA
antropologia inversa . culturas híbridas . criação de um tempo espaço de experimentação 



CANCLINI, Nestor Garcia. Estratégias para entrar e sair da modernidade, São Paulo, EDUSP, 1997 Culturas híbridas e poderes oblíquos
DEBORD, GUY. A Sociedade do Espetáculo
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
HUTCHEON, Linda. Poética do pós-modernismo. Rio de Janeiro. Imago, 1991.
LA POCHA NOSTRA . http://www.pochanostra.com  Acesso em 19.06.16
LOTUFO, J.J. Habitando Interstícios, A Arte da Performance entre Fronteiras, UFRJ. https://seminarioculturavisual.fav.ufg.br/up/778/o/2013-130-eixo3_J%C3%BAlia_Jenior_Lotufo.pdf  . Acesso em 19/06/16
SOUSA, L.L. O processo de hibridação cultural: prós e contras. http://periodicos.ufpb.br/index.php/tematica/article/view/21983 Acesso em 19/06/16
VANEIGEM, Raoul . A Arte de Viver para as novas Gerações ,1967


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'LA POCHA NOSTRA' CONHECENDO UMA EXPERIENCIA DE CRIAÇÃO NA PERFORMANCE

ARTESUNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR LITORAL . HISTÓRIA E APRECIAÇÃO DO TEATRO 

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

WOLFGANG LAIB 
PERFORMANCE RITUALÍSTICA ORGÂNICA



WOLFGANG LAIB utiliza materiais orgânicos como pólen, arroz e leite em suas obras.“Frieze of Life” mostra uma das mais icônicas instalações com polen e cinzas. Pólen simbolizando a origem da vida. Nesta instalação ele utiliza no chão, pólen de avelã peneirado, que foi cuidadosamente recohido à mão nos campos perto de seu estúdio na Alemanha. A presença do pólen cria uma intensa energia que o observador pode vere também sentir. Laib explica que que esta instalação tem uma cor incrível que não poderia jamais ser pintada. Diz: “Não é um pigmento, nem um pigmento natural tampouco; como o sol não um circulo amarelo nem o céu uma pintura azul.”
Wolfgang encontra espiritualidade na simplicidade do dia a dia e nas substâncias orgânicas que 'fornecem sustento e mantem a vida'. Em 1975 criou seu primeiro Milkstone numa série de esculturas elementais. Um bloco retangular de mármore branco polido,contendo uma ligeira depressão na superfície superior; esta peça foi enchida com uma fina camada de leite para promover a ilusão de uma forma sólida. Apesar de ser um objeto inerte, esta escultura requer uma participação ritualistica. Laib performa o primeiro ato de derramar o leite quando a peça é exibida, e depois deste gesto inicial, o pessoal domuseu (Guggenhein) limpa e reabastece pedra todos os dias que é vista.

A performance ritualistica tem um papel central na arte altamente redutiva do Laib. Em 'The Five Mountains Not to Clim On', através de uma escala intimista e intensamente frágil, suas esculturas de pólen de avelã aludem à monumentalidade sugerida pelo título da obra. A noção que há infinitude no infinitesimal é lindamente manifestada nesta prática estética.




domingo, 6 de novembro de 2016

AO PONTO ÔMEGA ATRAVÉS DA ARTE

No paradigma da complexidade, a incerteza, a indeterminação, a aleatoriedade, as contradições aparecem não como resíduos a serem eliminados pela explicação, mas como ingredientes não elimináveis da nossa percepção/concepção do real, e a elaboração de um princípio de complexidade precisa de que todos estes ingredientes alimentem a explicação complexa.

Uno-múltiplo, todo-partes, ordem-desordem, sujeito-objeto, observado-sistema observado....É complexo porque o paradigma sistema nos obriga a unir noções que se excluem no âmbito do princípio da simplificação. É complexo porque estabelece implicações mútuas entre noções classicamente distintas . É complexo porque introduz causalidade complexa.

Esta nova visão deixa de ser um pensamento de sobrevôo para se tornar um olhar situado, que busca compreender o que é o homem a partir dos fenômenos concretos por ele protagonizados, enfocando suas experiências, seu mundo vivido.

É tempo de encontrar metapontos de vista_  sobre a existência e a dinâmica da noosfera; sobre a tecnosfera a que estamos cada vez mais embrenhados; sobre este sistema vivo e mutante, intrincado é maravilhoso que é o corpo humano, seus sistema de constituição e informação; sobre  a dança como agente de criação, de conexão, de acesso_ que só podem aparecer com a ajuda das idéias complexas.  A subjetividade original de cada ser, através da atenção, da auto-observação e da experimentação, focadas através desta visão complexa, podem contribuir para o entendimento do processo de auto criação da própria realidade a partir de suas múltiplas interações.

Edgar Morim (2013) afirma:
“Uma nova racionalidade deixa-se entrever. A antiga racionalidade procurava apenas pescar a ordem na natureza, Pescavam-se não os peixes, mas as espinhas. A nova racionalidade, permitindo conceber a organização e a existência, permitiria ver os peixes e também o mar, ou seja, também o que não pode ser pescado” (Morin, 2013)

Este princípio conduz a uma prática responsável, liberal, libertária, comunitária e também à redescoberta da questão da sabedoria e à necessidade de fundar a nossa sabedoria. A procura dessa sabedoria é, nesse sentido, a procura da superação da cisão que se operou entre o universo da meditação e o da prática social.

A Arte é a grande chave. O meio pelo qual o sujeito poderá sair do excesso de racionalismo que normatiza e engessa e trazer à consciência especificidades a serem expressas que, por não estarem conscientizadas, encontram-se, na maioria das vezes inativas, inoperantes, asfixiadas, imobilizadas. A Arte oferece a criação de várias vias, intersecções, comunicações, ressonâncias, sinapses, neste caminho de acesso ao Ponto Ômega da consciência unificada.


            
O ATO REFLEXIVO o que fazer com a informação

É o corpo que nos abre inicialmente a possibilidade de vivenciar qualquer experiência nesta realidade mundana em que nos encontramos.  Para nos conduzir ao ato reflexivo que integra cada vez mais consciência, no processo continuo da evolução.

Ato Reflexivo é o termo utilizado por Teilhard de Chardin em seu estudo sobre a noosfera, como etapa decorrente da reflexão, do pensamento síntese que antecede a meta-morfose, a trans-formação da ação. O homem à medida em que foi desenvolvendo a consciência aprimorou a capacidade reflexiva voltando-se cada vez mais sobre si mesmo. 

O fenômeno da reflexão é um dos atributos centrais que diferem o homem do animal. O ato reflexivo gera o aprofundamento, o conhecimento e possibilita a afirmação do ‘eu’. Ele é um dado que transforma e enriquece a natureza humana. A partir do passo reflexivo já não há uma simples “mudança de grau”  entre o homem e o animal, mas uma “mudança de natureza - que resulta de mudança de estado” . Teilhard afirma que esta transformação é de infinita “relevância porque somos reflexivos, não somos apenas diferentes, mas outros”. O ser reflexivo representa um avanço radical na evolução, ele cria um universo interior. A vida interior manifestada pelas diversas atividades do espírito (abstração, lógica, matemática etc) representa uma nova realidade, é um outro mundo que nasce. Diz ele que a reflexão

“é o poder adquirido por uma consciência de se dobrar sobre si mesma e de tomar posse de si mesma ‘como um objeto’ dotado da sua própria consistência e do seu próprio valor: já não só conhecer - mas conhecer a si próprio; já não só saber - mas saber que sabe”. (Teilhard de Chardin, 1965)

Saber que sabe, é a auto-consciência. Unificar o sensível, que chega como uma informação trazida pelo corpo que dança, em um sentido novo. É o ato reflexivo que conduz o sujeito a perceber as coisas de um modo singular, ou seja, ampliando suas possibilidades de significação e, com isso, abrindo-o para outros modos de ver e de ser.

Segundo o neurologista português Antonio Damásio em seu livro O Mistério da Consciência, a consciência é uma sensação constituída por sinais não verbais dos estados do corpo. A idéia da consciência como um sentimento de conhecer, condiz com o fato das estruturas cerebrais operarem com o vocabulário não verbal dos sentimentos. Damásio mostra que a capacidade do corpo para sentir estímulos e reagir aos seus próprios processos e ao meio, é a chave para o fenômeno da consciência. Procura entender como o organismo portador da emoção podia tornar-se ciente daquele substrato cerebral do sentimento, concebendo uma explicação para como o sentimento torna-se conhecido pelo organismo que o sente.

A experiência estética nos abre para o novo, o inédito, o único, para aquilo que “exige de nós criação para dele termos experiência” (Merleau-Ponty, 2005, p.187).

Ao comparar o corpo à obra de arte e ao situá-lo como fundamento primeiro do eu, que se descobre outro na experiência estética, Merleau-Ponty (2004, 2006) anuncia uma compreensão da subjetividade como devir, em uma estética da existência, na qual a própria vida pode se (re)criar. A descrição fenomenológica da percepção, empreendida por Merleau-Ponty (2006), convida a um novo olhar sobre a subjetividade, onde o conhecimento de si e do mundo seja trazido não apenas pelo pensamento, mas através de manifestações da arte por ele protagonizadas, por exemplo, o corpo que dança, e possa atender à multiplicidade que constitui o ser humano.

Se no pensamento clássico a consciência era um fenômeno mental, uma operação do espírito, em Merleau-Ponty a consciência só emerge como ato reflexivo a partir do que é percebido pelo corpo. A subjetividade pode ser definida como a consciência de si, a autoconsciência. Para Merleau-Ponty (2006) existe uma consciência pré-reflexiva, que através da percepção corporal, conduz e possibilita um ‘ato reflexivo”.

Percepção (consciência pré-reflexiva) >>>corpo como lugar de um conhecimento originário do mundo e de si próprio >>>conhecimento ato reflexivo (consciência de si como pensamento extrato - síntese..)>>>>nova percepção (nova consciência pré-reflexiva)>>>>corpo como lugar de um novo conhecimento.....e assim sucessivamente numa relação circular

A subjetividade não é algo acabado, se constitui como processo, em sínteses provisórias, que se formam na medida em que o sujeito vivencia o sentido de si na relação com o mundo (conhecimento - ato reflexivo).


O CORPO QUE DANÇA

“O fim principal a ser proposto para si próprio, deve ser buscado no próprio sujeito, na relação de si para consigo”
FOUCAULT, M. História da sexualidade: o cuidado de si. Ed. Graal, Rio de Janeiro,  1985.

Lela Queiroz em Corpo, Mente, Percepção (2009) afirma que o corpo atua com dispositivos sensores que captam sinais no ambiente, externos, e respondem com ações capazes de lidar com os estados internos. É assim que otimiza ou impossibilita sua sobrevivência.

O corpo que dança, o corpo em movimento, acessa uma classe especial de linguagem onde o mais tênue impulso de sensação já vem acompanhado por sensações cinestésicas. Possibilita contato com o inconsciente cognitivo, cujo entendimento modifica o modo como lidamos diretamente com o corpo e modifica o modo como percebemos o mundo a nossa volta, as coisas que estão envolvidas, as correlações de nossas ações, gestos, atitudes e comportamentos.

No corpo, movimento é percepção. No corpo comunicador, o movimento é a condição da comunicação. O que instaura a comunicação no corpo é o movimento. O movimento é informação, o cérebro não é apenas o controlador do movimento.

A arte da dança é aquela que formula com o corpo as suas hipóteses especulativas sobre o mundo. Uma verdade interior (invisível) é expressa (tornada visível) pelo corpo que dança. A dança traz para a luz algo guardado em algum ‘quarto escuro’ do corpo. Uma informação muitas vezes ainda não acessada é trazida à tona pelo corpo que dança para ser conscientizada por ele. Não é uma expressão qualquer, mas é um ‘poderoso discurso confessional’ que por si só se legitima. Este corpo que dança a que nos referimos, dança, acima de tudo, para si. Por si e para si. Com diz Foucault (1985):

O fim principal a ser proposto para si próprio deve ser buscado no próprio sujeito, na relação de si para consigo” (FOUCAULT, 1985, p.69)

Esse trânsito entre o dentro e o fora diz respeito a todas as instâncias do corpo, e o cérebro seria o comandante principal das ações desse corpo situado num contexto irrigado por informações plurais, capazes de promover novas percepções para velhas questões. 

Para Katz (2003), a indeterminação do cérebro é sua força maior, pois, assim, ele se adaptaria ao corpo onde se encontra. Daí a idéia de processo, evolução e desenvolvimento constante e complexo. A co-evolução do cérebro daria, portanto, ao corpo o mérito das conexões para o entendimento das relações entre natureza e cultura.

Residiria nessa afirmação nossa responsabilidade na conformação de nosso corpo, através da seleção das “coleções de informação” em que desejamos nos “colar”, pois, da qualidade e variedade dessas informações dependeria, em certo grau, nossa própria constituição, influenciada também, obviamente, pelos determinismos biológicos e forças sociais. Ou seja, se as mudanças biológicas de nosso corpo são da ordem do determinado e ocorrem de forma extremamente lenta, nossas ações de percepção da informação, ao contrário, são rápidas, plásticas e transformadoras do corpo e do sujeito.

Somos seres moventes, em movimento e implicados em um mundo de movimentações. Tudo está em fluxo. Como afirma Helena Katz (2003):

“a dança é o pensamento do corpo”
para compreender a dança, precisamos de olhos que vejam aquilo que não porta visualidade plena.”

Para a autora, o corpo está em constante evolução e constitui-se em uma mistura de determinismos e aleatoriedades, isso porque ele opera de acordo com suas capacidades biológicas e altera-se em comunhão com o meio em que está inserido. Esse movimento do corpo, em sua relação com o espaço, estaria presente já no embrião humano e seria inestancável e permanente no curso da vida.

Katz (2003) corrobora com a visão já esboçada da relação evolutiva entre organismo e meio, na qual homem e natureza co-evoluem, e é sob essas circunstâncias que ela postula o corpo como mídia básica dos processos de comunicação da natureza. Esta abordagem propõe, portanto, o ser vivo como processador de informação entre o ambiente circundante e seu interior.

As transformações desses processos informacionais seriam uma exigência da maior complexidade da vida, sendo o corpo um lugar privilegiado, no que diz respeito à explicitação da evolução e do relacionamento entre natureza e cultura.

O corpo que dança, dança as improvisações do movimento, ou seja, movimentos não são coreografados ou pré-estabelecidos, acontecem em um plano de instantaneidade não programada e não repetida e nascem de um momento único na confluência dos fluxos. São movimentos criados instantaneamente, a partir das informações percebidas de forma intuída, inspirada e que jamais se repetirão.

Em que medida são informações ‘puras’ ou fruto do envolvimento da noosfera? Que tipo de informação está sendo acessado? Que meme está sendo replicado? Poderíamos dizer que não importa a origem do que inspira o movimento, até porque difícil será identificá-la. O importante é sentir e manifestar na dança a força presente. A dança desdobra-se continuamente entre o ato e a potência, mobilizando sua própria potencialidade enquanto linguagem, sua dançabilidade em sendo dança. O que a particularidade gestual de um corpo comunica é sua própria dançabilidade, ou seja, a potência de o movimento tornar-se dança, tornar-se linguagem.

A dançabilidade liberta o corpo que dança, das exigências da representação e permite uma experiência de dança que aponta para a legitimidade do movimento e dos gestos. Assim, garante à dança potência e subterfúgios para dizer de si mesma, sem a necessidade de dizer de algo e sem se despregar do corpo a qual pertence. Assim a dança, enquanto linguagem que se torna acontecimento, pode nos auxiliar na revelação desse campo de forças e sentidos.

Neste processo, a ação do tempo, do acaso, do aleatório e do imprevisível sempre estão presentes. O acaso pode introduzir ou reafirmar na dinâmica do corpo que dança, um modo de dialogar com o que está além do universo criativo ou referencial do dançarino, ou seja, com aquilo que ele não alcança, ao menos de forma consciente. Considerando que, em contrapartida, toda resultante desse diálogo passará por seu crivo, consequentemente, sua base social, cultural ou psíquica pode influenciar a condução do processo ou a aceitação dos resultados. O acaso é considerado então, como exercício de liberdade criativa que acolhe a tensão de transitar entre as fronteiras do controle e do descontrole, ou ainda, do previsível e do imprevisível. Perpassa por estimular procedimentos moldados na aceitação da incerteza, articulando uma maneira particular de integrar experimentação, espontaneidade e descoberta, sem submetê-los, a condições ou compromissos associados a resultados pré-estabelecidos.

Laban, (Rudolf Von Laban (1879-1958), eslováquio, bailarino, coreógrafo e considerado um dos mais importantes teóricos da dança do no século XX que buscou identificar os princípios inerentes ao movimento, afirma que o movimento é dançado quando “a ação exterior é subordinada ao sentimento interior”, abrindo no espaço a dimensão do infinito que compõe o tecido da dança. O dançarino pode ser considerado aquele que medita em movimento, sua alma está onde seu corpo está, e seu pé está onde sua alma está. A arte de dançar é o meio de tornar visível este jogo de forças invisível.

Somos corpo do mundo, pois a ele pertencemos. E somos corpo no mundo, pois nele agimos. E de que forma os movimentos do mundo se enredam aos nossos movimentos no mundo?

A dança se faz em teia, portanto pede conhecimentos plurais para ser investigada.

(serão expandidos estudos do BMC – Escola Corpo & Mente, Movimento e Contato – procedimentos por meio do contato e movimento, adentrando as camadas do organismo pela pele, por desenvolvimento evolutivo)












A INFORMAÇÃO o corpo como informação

“Nosso mundo faz parte de nossa visão de mundo, a qual faz parte do nosso mundo” (MORIN, Edgar Ciência com Consciência,2013)

O corpo é o primeiro suporte informacional humano e é ininterruptamente constituído a partir das trocas que realiza com o meio a que está inserido e com tudo o que lhe é decorrente. Vista sob a perspectiva da cultura contemporânea, a informação, enquanto signo, tem papel ativo nas mediações do corpo com qualquer fenômeno no mundo e tal relação se complexifica com o uso crescente e intenso das tecnologias de informação, que promovem uma aproximação cada vez maior entre homens e máquinas. Diálogo entre as ciências e o corpo, em seus aspectos contemporâneos e históricos.

Em nossa forma primordial de relação com e no mundo, sempre em ação, percebendo, processando, assimilando e criando informações em trocas inesgotáveis com o meio, nosso corpo-suporte processa informações sociais, culturais, biológicas e outras mais que o envolvem.

Trilhar o caminho dos signos que produzimos, das significações que estabelecemos e do ininterrupto processo da semiose, pode alargar a compreensão dos questionamentos sobre a vida e nossa relação com ela. Corpos, técnicas e cultura co-evoluem desde as primeiras constituições sígnicas do ser humano e, nesse sentido, o corpo é ampliado, expandido e reconfigurado continuadamente.

No corpo comunicador, o movimento é a condição da comunicação. Mover-se é sair de si para ser-com, é abrir-se para o outro, é o irradiar da consciência da interioridade para a corporeidade.

A informação está portanto em constante ação, em um fluxo ininterrupto e inesgotável de significação. Acreditamos que, uma vez que compreendermos o corpo como participante dos sistemas de informação - voltar interesses de pesquisa para essa relação, com foco no papel da informação nessa interação, pode trazer resultados inovadores.

O que fazer para captar esta informação?
Sentir, sentir e sentir...Entregar-se e permitir.

Por isso a dança em estado meditativo, ou seja, em estado de completa entrega interna, de completa expressão de si, é o instrumento de sintonia com a informação. Na verdade, em tudo uma questão de sintonia. Através da escuta sensível de si e do mundo, através do corpo, imergir em si e conscientizar-se de seus impulsos, conectando a informação da força criadora e trazendo-a à tona através do corpo que dança.

A informação viria então, a partir de um corpo ‘revolto’, animado, vivo do princípio superabundante e de energia, que num ‘ataque de lucidez’, num ataque de consciência, romperia com  convenções e certezas e transformaria o desejo em discurso _  trazendo a informação. E tornando o afeto fonte criativa e o discurso decorrente dele, um marco de ruptura e autonomia.

É o ato cognitivo mediado pelo sentir. Reflete o movimento existencial único, singular extratado pelo sujeito, carregado com seus valores, afetos, desejos, de modo que o sentido emergente desta relação é um sentido vital.

(os estudos serão expandidos para a percepção, a sensação, a intuição, atenção sobre si, como agentes de informação;  George Lakoff e Mark Johson concepção metafórica de conhecimento do mundo/construção destas metáforas via sistema sensório-motor no corpo/ os conceito são mentais e corporais)





O CORPO
“...para ocupar-se consigo mesmo, é preciso conhecer-se a si mesmo; para conhecer-se é preciso olhar-se em um elemento que seja igual a si; é preciso olhar-se em um elemento que seja o  próprio princípio do saber e do conhecimento; e este princípio do saber e do conhecimento é o elemento divino. Portanto é preciso olhar-se no elemento divino para reconhecer-se: é preciso conhecer o divino, para reconhecer a si mesmo.” (FOUCAULT, 2006, p 89)

Mas de que corpo estamos falando?



O corpo entra em cena como determinante de nossa existência, a partir do qual se tece o sujeito por vias de sua própria experiência no mundo.

Lela Queiroz, em seu livro Corpo, Mente, Percepção (2009) afirma que o corpo _ entendido como mediação do sistema-mundo em tempo real e mente encorpada _ diz respeito a todos os processos que exercem algum tipo de papel na invenção do conhecimento, e colocam mente e corpo como processos co-evolutivos.

Ao contrário do dualismo cartesiano, corpo e mente não estão separados, mas, antes, formam uma unidade, um todo indissolúvel. Existem entre eles vínculos íntimos. O corpo pode ser considerado como nosso primeiro suporte de informação. Nosso ser e estar no mundo – corpo –  é permeado por uma infinita teia de signos e linguagens. Portanto, é constituído dinamicamente pelas mediações que estabelece através das trocas informacionais com o meio em que se insere e com outros corpos, numa relação complexa e evolutiva. Ao mesmo tempo em que nos apropriamos desta teia, nós também a construímos. O corpo em seus sentidos, abre-se para si mesmo, para o outro e para o mundo, fazendo notar que a interioridade só existe exposta à exterioridade, alertando que o palpar e o ver demandam um ser palpado e outro visto. Corpo e mundo estão em construção perpétua, na trama da reversibilidade, transitividade e irredutibilidade de cada um dos sentidos que configuram o corpo sensível.

Às voltas com o enigma que nomeamos corpo, estão saberes fracionados em disciplinas das mais variadas. Descobertas recentes em estudos das ciências cognitivas sobre o complexo cérebro-corpo-ambiente (DAMÁSIO, EDELMAN, LLINAS, THOMPSON) foram fundamentais para novas investigações acerca do corpo. Um dos seus diferenciais de abordagem nos estudos de percepção passa pela consideração do corpo como eixo principal da cognição e de passar a entender percepção como ação (GIBSON, THELEN).

Merleau-Ponty (2006) assegurava que, somente através dessa fenomenologia incorporada, voltada para os modos de percepção, é que aprenderíamos a verdadeira filosofia, aquela que nos permitiria rever o mundo, via corpo. Corpo cognoscente que, portanto, “é iniciação ao mistério do mundo e da razão”.

Ainda segundo Merleau-Ponty (2006):
por vias da percepção o sujeito torna-se o lugar das coisas, a percepção não ocorre primeiramente no mundo; não há um estímulo de fora que ativa o corpo por dentro; não se sente por uma ação exterior ao corpo; a categoria da causalidade não se aplica nesse sentido. O campo perceptivo é sempre atual e denota uma superfície de contato ou um enraizamento no mundo, um assalto constante à subjetividade, à lacuna que somos. O sujeito que percebe é o mundo percebido, o corpo é um sensível-senciente, isto é, sente-se além de sentir e ser sentido, é sensível para si mesmo – um visível que se vê vendo, um tocante que se toca tocando, um móvel que se move movendo.”

Não somos um corpo objeto como querem as ciências, somos um corpo habitado e animado pela consciência. Ao mesmo tempo, não somos uma consciência cognitiva pura, visto que esta está encarnada em um corpo. Não somos puro pensamento, porque somos corpo. Não somos objetos, porque somos consciência. Nega-se ai, mais uma vez, qualquer separação que pudesse haver entre corpo e consciência, tornando-se, portanto, corpo-consciência.

Merleau-Ponty (2006) afirma que o visível está prenhe de invisibilidade, não sendo eles contrários ou comparáveis. São direito e avesso, visível e invisível, sensível e senciente, como dois lados irredutíveis de um só Ser.

Helena Katz, filósofa, pesquisadora, professora, crítica e palestrante nas áreas de Comunicação e Artes, em seu estudo Do Que Fala o Corpo Hoje? publicado em Teologia e comunicação: corpo, palavra e interfaces cibernéticas (2011), afirma a co-dependência entre corpo e ambiente, gerando a impossibilidade de se pensar em um sem pensar no outro. Diz ela:
“A cultura “carnifica-se” no corpo. O que está fora adentra, e as noções de dentro e fora deixam de designar espaços não conexos para identificar situações correlatas. As informações do meio se instalam no corpo; o corpo, alterado por elas, continua a se relacionar com o meio, mas agora de outra maneira, por está transformado. Assim transformado continua suas trocas, que agora passam a ser outras. O meio vai sendo modificado e o corpo também, em processos co-evolutivos permanentes e inestancáveis e as noções de dentro e de fora ficam desestabilizadas.”(KATZ, 2011)

Mas de que modo o entorno se torna corpo? Diz Katz em seu estudo Por uma compreensão do Contemporâneo (2008):
“O corpo nunca existe em si mesmo, nem quando está nu. Corpo sempre é um estado provisório da coleção de informações que o constitui como corpo. Esse estado vincula-se aos acordos que vão sendo estabelecidos com o ambiente onde vive.”(KATZ, 2008)

O corpo está inserido em um contexto. Porém a noção de contexto também é variável. Contexto inclui noosfera, sistema cognitivo (mente, pensamentos), mensagens que fluem paralelamente, memória de mensagens prévias que foram processadas ou experienciadas e, sem dúvida, antecipação de futuras mensagens que ainda serão trazidas à ação, mas já existem como possibilidade.  O contexto em que algo acontece nunca é passivo. Katz afirma que o ambiente no qual toda mensagem é emitida, transmitida e interpretada nunca é estático, mas sim contexto-sensitivo. Que trabalha em correlação com o corpo, no tratamento do fluxo de informações permanente que os comanda. Afirma ainda que o transito de trocas é tão intenso e frequente que impede o uso do verbo “ter” e pede pelo verbo “estar”, pois o corpo é um estado, apenas um estado dessa coleção de informações que vai mudando. Capturadas pelo nosso processo perceptivo, que as reconstrói com as perdas habituais com as perdas habituais a qualquer processo de transmissão, as informações passam a fazer parte do corpo de uma maneira bastante singular: são transformadas em corpo. Trata-se do processo de embodiment(10): são as interações entre corpo e mundo.(THELEN, Ester).

Se vamos transformando o mundo em corpo, há que atentar para e zelar pelo que vamos colocando no mundo, pelas atitudes que tomamos e pelas que não tomamos, uma vez que ambas marcam uma diferença nas transformações que estão sempre em curso.

A noosfera fala sobre uma atmosfera de trocas permanentes de informações que se aproximam e se amplificam por afinidade, reforçando-se e tendendo a borrar as próprias delimitações, produzindo uma plasticidade de fronteiras não controlável. É um traço evolutivo.

Katz diz que o homem esta diretamente implicado naquilo que ele observa, uma vez que a matéria se transporta no trânsito natureza – cultura – natureza _ cultura..... Não há melhor lugar para deixar explicito o tipo de relacionamento existente entre natureza e cultura que o corpo humano.

Nosso corpo é a porta de entrada do conhecimento. Idéias e emoções estão codificadas como informação nos memes (Dawkins, 1976) como replicadores de informação cultural, análogo ao gene. Pensamento e expressão estão misturados no movimento de um corpo que dança. Uma idéia (genótipo) se cristaliza no corpo (fenótipo) por fazer dele seu fenótipo estendido.

“Uma vez que os memes não vêm embrulhados por instruções para sua replicação, devem depender do padrão do nosso cérebro para fazer isto por eles. Trata-se de um estado de dependência que favorece o seu potencial proliferativo porque a máquina do cérebro constrói e continuamente atualiza modelos mentais do mundo para aumentar a assimilação e a implementação de memes e suas descendências.” (Gabora, 1997,20)

O meme faz parte da comunidade interpretativa que o fortalece ou o descarta conforme sucessivos acordos de sobrevivência. Isso significa que, quando selecionado, seu uso o torna recorrente, de tal modo que fica favorecido pela coletividade, e se espalha rapidamente por contaminação. Quanto mais repetido for, mais se acredita nele e mais aceito fica. A força de proliferação de uma idéia anda junto com a sua redundância e sua promoção como verdade metafórica. Esta é a atmosfera da noosfera, a atmosfera onde habitam e se replicam os memes.

Se conceitos estão fisicamente codificados no cérebro, como memes, e enraizados no corpo como seus fenótipos estendidos, nossos cérebros e corpos podem mudar _ memes são evolutivos. Por ser uma caracteristica estética de características singulares no trato do movimento, a dança pode contribuir no desvendamento dos modos de ‘manifestar informações no corpo’.


 (10) embodiment: incorporação, corporificação, encarnação.